22 May 2014

O desapego


Mesmo não estando em Londres por esses dias, não consigo me desligar de alguns feeds e timelines da vida virtual e, talvez por acaso, talvez por querer mesmo, eu reparei num quase ‘movimento’ que tem pipocado cada dia com mais força entre muitas meninas-mulheres brasileiras: o desapego. Blogueiras em especial tem se mostrado bem entusiastas da ideia que, aqui no texto no que eu quero mostrar, se trata exclusivamente do desapego sartorial: vender e/ou doar roupas, acessórios, sapatos, etc., que estão paradinhos no armário ou que simplesmente não fazem mais sentido ter.

Não vou listar ninguém, porque não preciso, basta passearem pelo YouTube, Vimeo e alguns blogs que vocês vão reparar. Eu comecei a prestar atenção quando a blogueira Barbara Resende, que já passou por aqui numa das conversas do Gato, fez um post enorme falando sobre como ela tinha tomado a decisão de se desapegar e o que me deixou interessada foi as respostas de leitoras, a grande maioria se identificando com isso e passando pelo mesmo problema. ‘Que problema, Gabi?’, o problema do desapego.

Pra muita gente desapegar é doloroso, é difícil, implica em escolhas e a possível exclusão de lembranças que estão imprimidas em coisas, objetos que, muitas vezes, não fazem mais parte do que a gente é ou quer, mas que já fizeram e, por isso, a gente acha que não deveriam sair de perto da gente. Mas desapegar não é tão complicado assim. Eu nunca fui muito apegada ao meu armário, não tanto quanto era por meus livros, e só fui começar a acumular roupas quando já estava na faculdade. Eu saí do interior de São Paulo pra morar no Rio, onde fiz a graduação e o mestrado, e com isso passei a experimentar-ver mais coisas, a gostar de mais coisas, a querer mais coisas e, dai, acumular. Sempre que voltava pra casa da minha mãe, lá ia eu pro armário me livrar de coisas e minha mãe sempre preocupada ‘mas, Gabriela, você não tem muita coisa, pra que dar isso, pra que dar aquilo?’, já sabem que minha mãe é do tipo que não desapega! (Te amo, mãe.)

Mas abrir mão daqueles objetos não me afetava, pelo contrário, eu gostava daquilo e me dava prazer doar e saber que teria gente que ia gostar e usar e aproveitar e dar vida a todas elas. Quando vim pra Londres eu passei a vender minhas coisas numa conta que criei no Ebay logo que cheguei. Uma amiga muito queria me ensinou a usar o site e eu não parei mais. E vender se tornou parte do kit de ‘sobrevivência sartorial’ pra mim, porque o dinheiro das vendas me rendia algo novo, então era uma troca. Com isso consegui criar um meio de financiar a tal curadoria do meu armário – que tem acontecido desde o início do ano passado e sobre a qual eu adorarei dividir mais por aqui – já que eu queria peças que fossem atemporais e que tivessem uma assinatura única. Foram-se Zaras, Toshops, Mangos, H&Ms, COSs, Kiplings (sim, várias, a Kipling é incrivelmente barata aqui no UK!), entrou Fendi, Stella, Chloé, Lanvin... Tudo com planejamento, economia e desapego, muito desapego!!! Explico: ao invés de ter cinco calças sociais de uma fast fashion, eu as vendia e no final conseguia uma graninha pra uma Stella e por aí vai. Hoje eu divido o armário com meu namorado (!!), espaço deixou de ser um problema e eu parei, aos poucos, de ter aquela crise do 'não tenho nada pra vestir, mas tem 3456 roupas no meu armário'. A curadoria é um processo lento e que precisa ser planejado e está longe de ser finita, ela é um continuum. E que fique claro: eu não deixei de comprar em lojas estilo fast fashion, eu deixei de acumular, o que é diferente, e passei a investir em coisas que tem uma durabilidade e atemporalidade que, pra mim, são primordiais hoje.

Não, não, não estou me gabando, eu não vivo para o Ebay e muito menos do dinheiro do Ebay (e não estou ganhando nada pra falar dele aqui), mas ele se tornou um grande parceiro na hora de juntar uma graninha e me ensinou muito sobre como negociar. (Ok, o correio inglês facilita muito a nossa vida, já que é super eficiente e barato!) Estou dizendo tuuuudo isso só pra mostrar um outro lado do desapego, o lado da curadoria! O lado que te faz não só pensar, planejar bem antes de sair comprando (o que a gente ganha não tem como controlar mesmo), mas acima de tudo te ensina um tanto mais sobre si mesma, sobre o que você realmente quer, o que usa, o que gosta, o que deseja. A Jana Rosa, que tem lojinha no site brasileiro Enjoei, fala bastante sobre a dificuldade de desapegar, e também sobre como ela descobriu, através de um desafio que impôs a si mesma, que havia muita coisa parada no armário e que ela mal lembrava que tinha.

Essa sensação da coisa ‘parada no armário’ é o que me causa mais angústia e o que, desde bem novinha, lá no comecinho da faculdade, me fazia desapegar. Se doar não for uma opção, faça um trato consigo mesma e gerencie seus gostos, suas escolhas. Venda, faça um bazar com as amigas, eu já fiz aqui em Londres e foi bem bacana! Mas não deixe os medinhos bobos te segurarem e te fazerem desperdiçar energia, espaço e dinheiro em coisas que não fazem mais parte da sua vida. E me contem se já passaram por isso ou pretendem desapegar em breve!


3 comments:

  1. Admito, tenho tendência à síndrome do esquilo e desapegar pra mim não é tão fácil, mas estou tentando melhorar isso :P Acho que você deveria mesmo escrever mais sobre o seu processo de curadoria sartorial, seria bem interessante! Beijo

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  2. Cristina Brummer9 June 2014 at 17:01

    Gabi, que texto mais inspirador! Nossa, toda vez que tu falas em curadoria do guarda-roupa eu morro de vontade de fazer o mesmo, mas é só passar na Zara mais próxima que o consumismo toma conta. Achei maravilhosa a ideia do Ebay, vou me informar mais e quem sabe não começo a ser um pouquinho mais 'Gabi' hehe :)

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  3. Aiii Gabi, vc pegou na minha ferida! rsrs... Sou eu sim uma ACUMULADORA de roupas, sapatos, bolsas, acessórios e até livros... Estou numa organização eterna do meu armário q nunca termina: são 8 portas 4 gavetas e uma cômoda de falta de espaço...

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